quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Mariana Henrichs Ribeiro

Letramento digital e a experiência estética na contemporaneidade
Mariana Henrichs Ribeiro (PPGE-UFJF)

Não posso me ver como totalidade, não posso ter uma visão completa de mim mesmo, e somente um outro pode construir o todo que me define.
Marília Amorim

            As tecnologias de informação e comunicação (TIC) têm provocado inúmeras mudanças em nossa sociedade. Através da utilização desses instrumentos uma janela se abre para o mundo. A possibilidade de trazer para os textos, sons, imagens e animações exige de seus usuários uma nova atitude. São novas práticas de leitura (compreensão) e escrita (produção), novos tipos de letramentos digitais. Segundo Buzato (2006), o usuário precisa ter uma participação ativa, é “necessário que “pratique” as TIC socialmente, isto é, que domine os diferentes "gêneros digitais" que estão sendo construídos sócio-historicamente nas diversas esferas de atividade social” (p. 7).
            Diferentes contextos geram diferentes necessidades e níveis de letramentos digitais. As demandas sociais de leitura e escrita dependem, diretamente, do contexto histórico do qual o indivíduo faz parte. A autora Magda Soares (2009) define letramento como “um contínuo que representa diferentes tipos e níveis de habilidades e conhecimentos, e é um conjunto de práticas sociais que envolvem usos heterogêneos de leitura e escrita com diferentes finalidades” (p. 83). Portanto, letramento digital pode ser considerado um conjunto de exigências sociais.
“Os três campos da cultura humana – a ciência, a arte e a vida – só fazem unidade no indivíduo que os incorpora à sua própria unidade” (BAKHTIN, 2003, p. XXXIII). Tentar compreender a arte na contemporaneidade é pensar no homem mergulhado no ciberespaço. Um espaço fluído, dinâmico e aberto. Um espaço sem fronteiras estabelecidas, sem caminhos determinados. Pensar a arte é entendê-la como um instrumento que mexe com as pessoas de uma forma muitas vezes inexplicável. Talvez porque a arte, seja ela expressada de diferentes maneiras, e a vida possuem uma relação dialética. Bakhtin, no texto o “Discurso na vida e o discurso na arte”, assegura que “O poeta, afinal, seleciona palavras não no dicionário, mas do contexto da vida onde as palavras foram embebidas e se impregnaram de julgamentos de valor”.
A arte só se torna arte na interação com o outro. Ela é um instrumento em constante construção. Através do espectador, a arte se atualiza e constrói novos sentidos. O objeto artístico adquire um acabamento, no sentido bakhtiniano, através do encontro com o outro, aquele que está de fora. Carmargo Júnior e Paulo entendendo o cinema enquanto arte, afirmam que 
vida e arte só fazem sentido apenas na unidade de quem as incorpora. O que queremos dizer? O cinema linguagem prende-se a vida e torna-se tão incerto, tão inseguro quanto à própria vida. O cinema que vemos não está pronto, ele está sempre se aprontando, esperando seu contato com vários sentidos que só surgirão no seu instante mágico de encontro com o público (2008, p. 165).

A arte é composta pelo caráter ideológico do signo, entendendo signo como um produto do convívio social. É formada por uma linguagem intencional, carregada de valores e ideologias. Sendo assim, jamais poderia ser considerada inocente. A ideologia, segundo Bakhtin, é uma forma de representação da realidade. O ato artístico possibilita, portanto, a reconstrução da realidade ao seu modo, ao seu tempo e ao seu espaço.
Cada pessoa que contempla uma obra possui suas próprias ideologias e seu excedente de visão. O que eu vejo complementa a visão do outro. Às vezes um aspecto ainda invisível para mim, se tornou visível através do olhar do outro. Esse outro que me faz ver, em certos momentos, se materializou como o outro-indivíduo e/ou outro-obra. Segundo Machado
Todas as visões são relativizadas/determinadas pelo posicionamento: um indivíduo sempre vê o que está fora do campo de visão de um outro. No campo de visão de um existe sempre um excedente de visão – algo que sua visão não alcança devido à posição que ocupa no espaço (2007, p. 194).

“A arte, como todos os produtos da atividade humana, nasce na e para a sociedade, portanto ela é essencialmente social” (FREITAS, 2000, p. 142). A arte, na contemporaneidade, está a um clique do mouse. O computador e a internet possibilitam a experiência estética, por exemplo, através da vivência de visitas virtuais a museus, exposições, galerias[1]. O internauta passeia por paisagens, figuras de pessoas, estatuas. O indivíduo, por meio da tela, tem contato com obras que estão em espaços e tempos diferentes do seu.    
Essas foram algumas reflexões e refrações construídas através de algumas leituras realizadas. A vida é um entrecruzamento de estéticas. Pensar a arte e a vida é buscar uma formação humana. A formação de uma nova maneira de olhar para a tela, para a imagem projetada, para o objeto materializado, para os sentidos construídos a partir das experiências vividas e das ideologias.
Pensar a relação entre Educação e Arte, fugindo da típica experiência escolar em conversar sobre a arte. Buscamos ir além, queremos em uma relação dialógica, conversar com a obra artística. Encontrar, através do olhar alheio, algo que me complete.

REFERÊNCIAS
AMORIN, Marília. Cronotopo e exotopia. In: BRAIT, Beth (org). Bakhtin: outros conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2008. p. 95-114.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
______. Discurso na Vida e Discurso na arte (sobre a poética sociológica). Tradução de Cristovão Tezza para uso dadático; [data desconhecida].
BUZATO, M. Letramentos Digitais e formação de professores. São Paulo: Portal Educare. 2006. Disponível em: <http://www.educarede.org.br/educa/img_conteudo/marcelobuzato.pdf>. Acesso em: 02 jul. 2009.
CARMARGO JÚNIOR, Ivo Di; PAULO, Sidney de. Entrecruzando estéticas para tentar definir a linguagem cinematográfica. In: GRUPO de Estudos dos Gêneros do Discurso – GEGE. Arenas de Bakhtin – linguagem e vida. São Carlos: Pedro e João Editores, 2008, p. 165- 172.
FREITAS, Maria Teresa de Assunção. Vygotsky e Bakhtin – Psicologia e Educação: um intertexto. São Paulo: Ática, 2000.
MACHADO, Irene A. Os gêneros e a ciência dialógica do texto. In: FARACO, Carlos Alberto; TEZZA, Cristovão; CASTRO, Gilberto (Orgs.). Diálogos com Bakhtin. Curitiba: Editora UFPR, 2007. p. 193-230.
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.


[1] Museu Virtual de Arte Brasileira – Arte Contemporânea (site: http://www.museuvirtual.com.br/)
EPLURIBUSUNUM Galeria de arte virtual (site: http://www.epluribusunum.lu/pt/accueil_galerie_virtuelle.php)
National Gallery of Art – Washington (site: http://www.nga.gov/exhibitions/webtours.htm)
Museu do Louvre – Paris (site: http://www.louvre.fr/espanol.htm

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